quinta-feira, 10 de junho de 2010

Artigo didatizado.

Ao observar as tendências lingüísticas que os falantes de nosso português do Brasil se apropriam, constata-se que diante da língua coloquial existem maneiras peculiares do dizer. Dentre muitos pontos que já foram exaustivamente tratados, nesse pequeno artigo irei me atentar ao uso dos parênteses a partir de um trecho de texto conversacional. Desse modo, iremos tentar entender por quais motivos e de que maneira se dá o uso parentético na fala. Farei isso amparada pelo artigo “Parênteses: Propriedades identificadoras” presente no volume IV de Gramática do Português Falado.
Os parênteses têm como função a inserção de informações, que acabam sendo uma estratégia de construção do texto falado. Essa inserção ocorre como um tipo de encaixe dentro da linearidade do discurso que gera uma mudança no percurso do tema que estava sendo dito. Para entendermos esse fenômeno da inserção, é necessário compreender também o conceito de tópico. O tópico agrega em si a idéia central do texto e é ele que orienta o restante do que vai ser dito. Temos então que, quando se faz a inserção por meio dos parênteses, há também o desvio no assunto do tópico. Esses encaixes que ocorrem no texto não podem ser considerados um tipo de tópico por não projetar e desenvolver o tema da interação verbal.
Partindo desse critério de topicalidade discursiva, identificam-se os parênteses como desvios momentâneos que podem atuar como: (i) pausas antes ou depois dos encaixes (ii) ausência de conectores do tipo lógico, que estabeleceriam relações lógico-semânticas entre os parênteses e os enunciados proferidos (iii) mudanças prosódicas (mudança na tessitura ou na velocidade da elocução) em contraste com o contexto.
Apesar de o parênteses ser um desvio no assunto central do enunciado, não podemos subjugá-lo como uma informação totalmente fora de contexto. Isso porque ele tem um papel de carregar uma significação que por muitas vezes tem relação direta com o assunto central da elocução. Dessa forma, ao fazer tais inserções, promovem-se esclarecimentos, atenuações, ressalvas, comentários.
E é na explicitação verbal que ocorre de fato, a integração do desvio no texto, pois gera uma significação que se torna parte integrante aos demais componentes textuais, sendo assim um elemento intrínseco do texto.
Dentro desse conceito, emerge também uma perspectiva analítica com base na interação com o outro. E assim os parênteses se tornam um fato textual no processo comunicativo em que a linguagem é vista como uma ação que é exercida por falantes que têm relação entre si dentro de um contexto. Por isso temos que os falantes tem uma relação espaço-temporal e histórico-social que unem esses locutores e permitem a compreensão desses desvios textuais.
Enxergando os parênteses dentro dessa concepção que é pragmática de linguagem e texto, constatamos que o texto é uma unidade lingüística dada dentro de uma relação sócio-comunicativa dos interlocutores. E esse texto falado é gerado quase que simultaneamente à sua formulação, apresentando marcas de interlocução ativa dos falantes no ato da comunicação.
Analisando os usos dos parênteses dentro de um trecho conversacional que foi extraído de um inquérito, percebemos que é necessário fazer um recorte do contexto para eu se possa observar, de fato, a suspensão temática que ocorre no texto. Essa delimitação (recorte) se dá a partir da propriedade tópica de centração que possui três traços correlacionados: (i) concernência, (ii) relevância, (iii) pontualização temática.
A concernência se dá na relação semântica que os enunciados têm entre si, por meio do qual se dá a construção temática. No trecho analisado, se constrói o tópico profissão do marido de uma das falantes sobre o qual há a interação das interlocutoras na conversação. Os enunciados se relacionam por meio da coesão entre suas palavras do mesmo campo conceitual (no caso, a profissão do marido), estabelecendo assim, um recorte também no campo semântico. Há também mecanismos de concernência entre os enunciados que se articulam entre si por mecanismos de junção e articuladores textuais, fazendo a costura dentro da estrutura do segmento.
A relevância do tema “profissão do marido” acontece a partir da posição assumida pelos elementos constitutivos do enunciado, em que são observados os temas. Esses temas são quase que em totalidade manifestos pelo pronome “ele” que evoca o tema “profissão do marido”, localizando a pergunta inicial introdutória ao tópico discursivo.
Relevância e concernência são de grande importância dentro da elocução, pois elas tornam a unidade textual coesa e coerente. Dessa forma, elas são imprescindíveis para o contorno do segmento, que se distingue dos outros, mudando a centração.
E, por último, temos a característica da centração que é a pontualização, ou seja, a localização do segmento tópico em algum momento da conversação.
Concluindo esses apontamentos contextualizadores dos parênteses, ressaltou-se a concernência, a relevância e a pontualização, que por meio de suas marcas projetadas no texto, se relacionam e configuram uma propriedade tópica de centração que é tomada como critério de delimitação dos segmentos tópicos.
Observando os segmentos contidos nos parênteses, notamos que não se integram no tópico relevante do contexto, não havendo concernência entre eles. O tema “profissões do marido” é totalmente comprometido, quando a interlocutora passa a falar de si mesma, mudando o foco da conversação de maneira considerável. Essa quebra na progressão temática é observada na interrupção do enunciado por meio dos parênteses.
Porém, o que podemos concluir é que mesmo que haja essa quebra na progressão temática, os parênteses em questão, integram-se de alguma forma no contexto da conversação. Isso porque, trazem para o texto explicitações sobre a situação enunciativa que tem implicações sobre a significação dos outros enunciados. Ou seja, mesmo que estejam dando informações anexas ao texto, elas não dão totalmente descabidas em sua aparição na conversação. Muito pelo contrário, atualizam os elementos no espaço discursivo. Apesar de desviar do contexto, o parêntese se articula com ele, por atuar sobre o conteúdo das proposições que de fato criam esse contexto.


Referências Bibliográficas
Castilho, Ataliba de Teixeira. “Parênteses: Propriedades identificadoras”, pág 405. GRAMÁTICA DO PORTUGUÊS FALADO. vol. IV. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 2002.

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